quinta-feira, 1 de outubro de 2009

PALESTRA E CINEMA

ESTADO DO MARANHÃO
UNIDADE REGIONAL DE EDUCAÇÃO DE AÇAILÂNDIA
DEPARTAMENTO PEDAGÓGICO
PROGRAMA DA APRENDIZAGEM ESCOLAR - GESTAR II - LÍNGUA PORTUGUESA


RELATÓRIO V – Quinto Encontro

Assunto: Palestra “Gêneros Textuais: Possibilidades de Atividades” e Exibição do filme: “Narradores de Javé” (TP3 e TP4)
Rede Estadual: Unidade Regional de Educação de Açailândia/MA - UREA
Turma: única
Município: Açailândia – MA
Encontro: 28/08/2009 4 horas de estudos


O encontro para o dia 05/09, conforme previsão do cronograma foi adiantado para o dia 28/08, devido a solicitação de alguns cursistas que iriam fazer seletivo para professor da UEMA – Universidade Estadual do Maranhão e uma maioria que estava com viagem marcada. Ficou acordado que este dia seria anteposto em 28/08 – 4 horas e reposto em outubro as outras 4 horas, quando estaremos socializando os portfólios das três turmas (1 da rede estadual e 2 da rede municipal) dentre outras atividades.
PROGRAMAÇÃO EFETIVADA NO DIA 28/08


LEITURA COMPARTILHADA: FELICIDADE CLANDESTINA - CLARICE LISPECTOR


A leitura do conto Felicidade Clandestina de Clarice Lispector, foi realizada pela formadora Elaine Beatriz, após várias informações sobre a citada autora e sua obra.
Os professores cursistas gostaram muito do texto. Não poderia ser diferente, Clarice fascina e emociona também nesse conto. A importância do ato de ler para e com os nossos alunos, a importância dos diferentes mundos revelados através da leitura e o prazer de ler foram temas de discussões no grupo.

Leitura pela formadora: Elaine Beatriz
Felicidade Clandestina - Clarice Lispector
Os melhores contos brasileiros do século, Seleção Ítalo Moriconi. Objetiva,2001 p.312 – 314.
Felicidade Clandestina


Ela era gorda, baixa, sardenta e de cabelos excessivamente crespos, meio arruivados. Tinha um busto enorme; enquanto nós todas ainda éramos achatadas. Como se não bastasse, enchia os dois bolsos da blusa, por cima do busto, com balas. Mas possuía o que qualquer criança devoradora de histórias gostaria de ter: um pai dono de livraria.

Pouco aproveitava. E nós menos ainda: até para aniversário, em vez de pelo menos um livrinho barato, ela nos entregava em mãos um cartão-postal da loja do pai. Ainda por cima era de paisagem do Recife mesmo, onde morávamos, com suas pontes mais do que vistas. Atrás escrevia com letra bordadíssima palavras como "data natalícia" e "saudade".

Mas que talento tinha para a crueldade. Ela toda era pura vingança, chupando balas com barulho. Como essa menina devia nos odiar, nós que éramos imperdoavelmente bonitinhas, esguias, altinhas, de cabelos livres. Comigo exerceu com calma ferocidade o seu sadismo. Na minha ânsia de ler, eu nem notava as humilhações a que ela me submetia: continuava a implorar-lhe emprestados os livros que ela não lia.

Até que veio para ela o magno dia de começar a exercer sobre mim uma tortura chinesa. Como casualmente, informou-me que possuía As reinações de Narizinho, de Monteiro Lobato.

Era um livro grosso, meu Deus, era um livro para se ficar vivendo com ele, comendo-o, dormindo-o. E completamente acima de minhas posses. Disse-me que eu passasse pela sua casa no dia seguinte e que ela o emprestaria.

Até o dia seguinte eu me transformei na própria esperança da alegria: eu não vivia, eu nadava devagar num mar suave, as ondas me levavam e me traziam.

No dia seguinte fui à sua casa, literalmente correndo. Ela não morava num sobrado como eu, e sim numa casa. Não me mandou entrar. Olhando bem para meus olhos, disse-me que havia emprestado o livro a outra menina, e que eu voltasse no dia seguinte para buscá-lo. Boquiaberta, saí devagar, mas em breve a esperança de novo me tomava toda e eu recomeçava na rua a andar pulando, que era o meu modo estranho de andar pelas ruas de Recife. Dessa vez nem caí: guiava-me a promessa do livro, o dia seguinte viria, os dias seguintes seriam mais tarde a minha vida inteira, o amor pelo mundo me esperava, andei pulando pelas ruas como sempre e não caí nenhuma vez.

Mas não ficou simplesmente nisso. O plano secreto da filha do dono de livraria era tranquilo e diabólico. No dia seguinte lá estava eu à porta de sua casa, com um sorriso e o coração batendo. Para ouvir a resposta calma: o livro ainda não estava em seu poder, que eu voltasse no dia seguinte. Mal sabia eu como mais tarde, no decorrer da vida, o drama do "dia seguinte" com ela ia se repetir com meu coração batendo.

E assim continuou. Quanto tempo? Não sei. Ela sabia que era tempo indefinido, enquanto o fel não escorresse todo de seu corpo grosso. Eu já começara a adivinhar que ela me escolhera para eu sofrer, às vezes adivinho. Mas, adivinhando mesmo, às vezes aceito: como se quem quer me fazer sofrer esteja precisando danadamente que eu sofra.

Quanto tempo? Eu ia diariamente à sua casa, sem faltar um dia sequer. Às vezes ela dizia: pois o livro esteve comigo ontem de tarde, mas você só veio de manhã, de modo que o emprestei a outra menina. E eu, que não era dada a olheiras, sentia as olheiras se cavando sob os meus olhos espantados.

Até que um dia, quando eu estava à porta de sua casa, ouvindo humilde e silenciosa a sua recusa, apareceu sua mãe. Ela devia estar estranhando a aparição muda e diária daquela menina à porta de sua casa. Pediu explicações a nós duas. Houve uma confusão silenciosa, entrecortada de palavras pouco elucidativas. A senhora achava cada vez mais estranho o fato de não estar entendendo. Até que essa mãe boa entendeu. Voltou-se para a filha e com enorme surpresa exclamou: mas este livro nunca saiu daqui de casa e você nem quis ler!

E o pior para essa mulher não era a descoberta do que acontecia. Devia ser a descoberta horrorizada da filha que tinha. Ela nos espiava em silêncio: a potência de perversidade de sua filha desconhecida e a menina loura em pé à porta, exausta, ao vento das ruas de Recife. Foi então que, finalmente se refazendo, disse firme e calma para a filha: você vai emprestar o livro agora mesmo. E para mim: "E você fica com o livro por quanto tempo quiser." Entendem? Valia mais do que me dar o livro: "pelo tempo que eu quisesse" é tudo o que uma pessoa, grande ou pequena, pode ter a ousadia de querer.

Como contar o que se seguiu? Eu estava estonteada, e assim recebi o livro na mão. Acho que eu não disse nada. Peguei o livro. Não, não saí pulando como sempre. Saí andando bem devagar. Sei que segurava o livro grosso com as duas mãos, comprimindo-o contra o peito. Quanto tempo levei até chegar em casa, também pouco importa. Meu peito estava quente, meu coração pensativo.

Chegando em casa, não comecei a ler. Fingia que não o tinha, só para depois ter o susto de o ter. Horas depois abri-o, li algumas linhas maravilhosas, fechei-o de novo, fui passear pela casa, adiei ainda mais indo comer pão com manteiga, fingi que não sabia onde guardara o livro, achava-o, abria-o por alguns instantes. Criava as mais falsas dificuldades para aquela coisa clandestina que era a felicidade. A felicidade sempre iria ser clandestina para mim. Parece que eu já pressentia. Como demorei! Eu vivia no ar… Havia orgulho e pudor em mim. Eu era uma rainha delicada.

Às vezes sentava-me na rede, balançando-me com o livro aberto no colo, sem tocá-lo, em êxtase puríssimo.

Não era mais uma menina com um livro: era uma mulher com o seu amante.
(foto)
Clarice Lispector
http://davidcorreiajunior.files.wordpress.com/2008/08clarice.jpg Em 26 set 2009.



PALESTRA: "GÊNEROS TEXTUAIS:POSSIBILIDADES DE ATIVIDADES "


Ângela Nascimento, professora coordenadora do Centro de Ensino Antônio Carlos Beckman, em Açailândia – MA, foi convidada para ministrar esta palestra, a fim de ampliar os conhecimentos dos professores cursistas em relação aos novos gêneros que surgem com as novas tecnologias da comunicação e informação.
Foram abordados as concepções de gêneros e tipos textuais; os fundamentos teóricos segundo os PCNs; como trabalhar gêneros textuais em sala de aula e dez sugestões práticas; duas propostas de trabalho realizadas pela palestrante como por exemplo: Argumentando a moral da história com o gênero fábula; os novos gêneros: e-mails, chats, salas de bate-papo, as listas de discussão, os weblogs (blog).
O trabalho envolveu a atenção de todos e proporcionou a interação e interatividade com o grupo, além de oportunizar o conhecimento de ações práticas com os gêneros já conhecidos e os novos gêneros digitais nem tão apropriadas por todos.

(foto)
Tema da palestra

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Professora Ângela Nascimento palestrando



SESSÃO PIPOCA E GUARANÁ
EXIBIÇÃO DO FILME NARRADORES DE JAVÉ


Assistimos ao filme com o “olhar” voltado para as questões da Leitura e Processos de Escrita, tema do TP4 do Gestar II de Língua Portuguesa.

Após a exibição, contamos com a participação das professoras de História Rute Pereira e de Língua Portuguesa Ivanete Carvalho que fizeram comentários enriquecedores alusivos ao mesmo.
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Cada professor recebeu um roteiro para análise de “Narradores de Javé” e sugestões com possibilidades para a elaboração de um plano de trabalho, a fim de ser aplicado com seus alunos.

Todo cursista presente foi envolvido pela irreverência do filme brasileiro, dirigido por Eliane Café. Com muito humor ele traz assuntos importantes e atuais que possibilitaram várias discussões, como:

- A importância da escrita para o registro da memória de um povo. Javé é uma comunidade essencialmente oral e a personagem Antônio Biá (José Dummont, carteiro da agência de correios) é quem sabe ler e escrever, tinha um certo poder por esse motivo. “Uma coisa é coisa acontecida. Outra é coisa escrita. O escritor melhora o acontecido.” Esta fala de Biá evidencia a importância do seu papel quando passa a ser o escritor oficial do dossiê científico que salvaria Javé;

- A leitura e sua função social, alfabetização e letramento;

- As narrativas dos “Narradores” conforme o ponto de vista de cada um;

- A variedade linguística do Português apresentada através do jeito/modo de falar das personagens, expressões utilizadas e os vários dialetos. As expressões tipicamente nordestinas;

- O progresso que chega na região através da hidrelétrica, mas a pequena comunidade fica debaixo d’água e “o povo destruído”;

- A diversidade de gêneros textuais, oral e escrito: carta, bilhete, piada, lenda, placa do governo, música, hinos, ladainhas, provérbios, fotografia e outros;

- Outros aspectos que envolvem a interdisciplinaridade e/ou a intertextualidade: a questão da transposição do rio São Francisco, cidadania, ética, credibilidade de Biá, a água no mundo e questão ambiental, comunidade negra e cultura africana, tipos e gêneros textuais, Moisés salva seu povo na travessia do Mar Vermelho, preconceito com a idosa...

Além de tudo isso, foi comentado a qualidade do trabalho dos atores, como as personagens de José Dummont ( Antônio Biá- carteiro da agência de correios), Nelson Xavier que inicia a história com a frase...”eu mesmo, que não sou das letras vou contar um causo e acho que vocês não vão querer ouvir” e então todos puderam mergulhar no tempo, o atual, o passado e o lendário. Os próprios figurantes que são habitantes de “Javé” e atores do filme, desempenharam muito bem seus papéis. Javé na verdade é uma cidade muito pequena chamada Gameleira do Estado da Bahia, próxima a Lapa, na região nordeste.

O título também chamou a atenção dos professores, “narradores” no plural, que permite a realização de inferências sobre histórias que serão contadas. Os sinais de pontuação como a vírgula que posteriormente se transforma em dois pontos, em seguida em ponto final e reticências informam, dão pistas, sobre o que acontecerá.

Para finalizar, foi sugerido que os educadores planejassem a “sessão cinema” usando “Narradores de Javé” em sala de aula, vinculando esse uso ao “Projeto Final Cartas”, elaborado coletivamente pela turma.



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Professores cursistas e formadoras: Elaine Beatriz, Fátima e Neiva


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Rute Pereira
Coordenadora da Casa do Professor e Ivanete Carvalhho Diretora de Educação da URE – Unidade Regional de Educação de Açailândia – MA, convidadas para comentarem o filme Narradores de Javé.

Um comentário:

  1. este dia foi muito proveitoso, assistimos o filme Narradores de Javé, onde é discutido a importância da leitura e da escrito no dia a dia. a palestra com a professora Ângela sobre os Gêneros Textuas foi maravilhosa, aprendemos com o relato dela á trabalharmos com os nossos alunos...

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